. Origem da Vida

Introdução

Por volta do século XIX, acreditava-se que os seres vivos podiam surgir espontaneamente de matéria bruta. Dessa idéia surgiu a Teoria da Geração Espontânea ou Teoria da Abiogênese. Essa teoria, entretanto, foi contestada por vários cientistas, que, através de seus experimentos, provaram que um ser vivo só se origina de outro ser vivo. Surgiu, então, a atualmente aceita Teoria da Biogênese.

Biogênese x Abiogênese: a polêmica entre os pesquisadores:

As idéias de Van Helmont

Jean Baptista Van Helmont ( 1577-1644 ), célebre médico belga, elaborou uma receita para produzir ratos por geração espontânea: "... colocam-se, num canto sossegado e pouco iluminado, camisas sujas. Sobre elas espalham-se grãos de trigo, e o resultado será que, em 21 dias, surgirão ratos..."(o suor humano era o princípio ativo) . Como já se sabe hoje, os ratos não surgiam por causa da receita, mas eram atraídos pela mistura.

A experiência de Redi

Por volta de 1660, Francesco Redi ( 1626 - 1697 ), cientista italiano, começou a combater a teoria da geração espontânea. Na sua época, uma das principais evidências da abiogênese era o aparecimento "espontâneo" de vermes em carne podre.

Redi, então, colocou pedaços de carne crua dentro de frascos, deixando alguns abertos e outros fechados com gaze. Após alguns dias, Redi constatou a presença de numerosos ovos e larvas de insetos sobre a gaze que fechava o recipiente e ausência deles sobre a carne.

Esse experimento demonstrou que os insetos eram atraídos pela carne e que as larvas presentes na carne destampada se desenvolveram a partir de ovos de moscas e não pela transformação da carne em putrefação, como afirmavam os adeptos da abiogênese.

Os resultados de Redi fortaleceram a teoria da biogênese, mas, apesar disso, muitos ainda continuavam aceitando a teoria da geração espontânea.

Experiência de Needham

Em 1745, um naturalista inglês, John Turberville Needham (1713-1781), fez uma série de novas e interessantes experiências que reforçaram a idéia da origem da vida pela abiogênese.

Needham colocou um caldo nutritivo em diversos frascos, fervendo-os por 30 minutos e arrolhando-os; depois de alguns dias, os caldos estavam repletos de seres microscópicos . Assumindo que a fervura tinha matado todos os seres eventualmente existentes no caldo e que nenhum ser vivo poderia ter penetrado através das rolhas, Needham argumentou que só havia uma explicação: os microorganismos surgiram por geração espontânea.

Spallanzani X Needham

Vinte e cinco anos mais tarde, um padre italiano, Lazzaro Spallanzani (1729 - 1799), elaborou uma crítica devastadora às conclusões de Needham. Em suas experiências, Spallanzani colocou caldo nutritivo em 19 frascos que foram cuidadosamente fechados e muito bem fervidos durante 1 hora. Examinando-os depois de alguns dias, não encontrou qualquer sinal de vida em nenhum deles. Mostrou, assim, que Needham não tinha aquecido os seus frascos o suficiente para matar todos os seres neles existentes.

Os experimentos de Spallanzani não convenceram Needham, que reagiu com um argumento que pareceu incontestável para a época: a fervura por muito tempo destruía o "princípio ativo" , um misterioso princípio inerente à vida que devia existir no caldo. Como Needham tinha a seu lado o peso da opinião pública, que, em geral, só muda vagarosamente, a abiogênese continuou dominado.

Até cerca de 100 anos atrás, a maioria dos cientistas aceitavam como válida a teoria da geração espontânea.

Pasteur e o pescoço de cisne

Por volta de 1860, o cientista francês Louis Pasteur (1822 - 1895) começou uma análise sobre o problema da origem da vida. Ele havia demonstrado, em outras ocasiões, que o ar é uma fonte de microorganismo. Entretanto isso não foi suficiente para invalidar a hipótese da abiogênese.

Em novo experimento, Pasteur preparou 4 frascos de vidros contendo caldos nutritivos e amoleceu seus gargalos no fogo, esticando-os e curvando-os de modo que tomassem a forma de um pescoço de cisne. Em seguida, ferveu os caldos até que saísse vapor pela extremidade do gargalo. À medida que os frascos esfriavam, o ar do exterior penetrava pelo gargalo.

As partículas suspensas no ar ficavam retidas nas paredes do pescoço longo e curvo, que funcionava, assim, como uma espécie de filtro de ar.

Nenhum dos 4 frascos por ele preparados se contaminou. Quando o gargalo do frasco foi quebrado, após algum tempo verificou-se que havia desenvolvimento de microorganismo.

Este experimento mostrou que um líquido, ao ser fervido, não perde o "princípio ativo" , como defendiam os adeptos da abiogênese, pois, quando o pescoço do frasco é quebrado, há o aparecimento de seres vivos. O experimento rebate ainda outro argumento dos adeptos da abiogênese: a formação do ar viciado impróprio à vida. O líquido fervido fica, neste caso, em contato com o ar atmosférico através do pescoço do frasco, e mesmo assim não ocorre o aparecimento de seres vivos.

Com esse célebre experimento, Pasteur ganhou o prêmio da Academia Francesa de Ciência, e a teoria da biogênese passou a ter preferência no meio científico.

 

Como surgiu o primeiro ser vivo?

Várias hipóteses foram formuladas para explicar a origem da vida, sendo a mais aceita atualmente a "hipótese da evolução gradual dos sistemas químicos", desenvolvida pelo inglês J.B.S.Haldane (1892 - 1964), em 1929, e pelo russo A.I. Oparin (1894 - 1980), em 1936.

A partir da hipótese de que as substâncias que formam os seres vivos poderiam estar presentes na Terra primitiva, os cientistas Oparin e Haldane imaginaram um possível caminho para a origem da vida.

Segundo eles, as chuvas constantes devem ter arrastado as moléculas originadas na atmosfera para os lagos e mares em formação. O acúmulo dessas substâncias, por centenas e milhares de anos, teria transformado os lagos primitivos em verdadeiros "caldos" de substâncias precursoras da vida.

Na opinião de Oparin, as moléculas orgânicas acumuladas nos lagos podem ter se agregado, originando pequenos glóbulos, os coacervados.

A hipótese dos coacervados baseia-se no fato de que moléculas de proteínas dispersas em água formam uma suspensão coloidal com características próprias.

A Experiência de Miller

A hipótese da evolução gradual dos sistemas químicos foi testada pela primeira vez pelo químico americano Stanley L. Miller, em 1953. Ele construiu um aparelho que simulava as condições da Terra primitiva e introduziu neles os gases amônia, hidrogênio, metano e vapor d'água. Um dispositivo elétrico de alta voltagem produzia faísca dentro do aparelho, simulando os raios das tempestades.

Depois de alguns dias funcionando, a água e o vidro do aparelho ficaram impregnados por uma substância viscosa e avermelhada. Analisando essa substância, Miller verificou que ela era rica em aminoácidos, tipos de moléculas orgânicas que fazem parte das proteínas dos seres vivos.

Dúvida

Nos últimos anos, alguns cientistas questionaram esses experimentos sobre a origem da vida. As condições reinantes na Terra primitiva, argumentam eles, podem ter sido muito diferentes daquelas supostas nas experiências de Miller. A atmosfera da Terra primitiva pode não ter contido metano e amônia e, nesse caso, ela não teria sido tão favorável para a síntese de compostos orgânicos, e/ou, os oceanos não estavam fervendo na época em que a vida começou a evoluir ( Miller preferiu trabalhar com água fervendo por razões técnicas: os gases circulam com mais rapidez e as reações químicas são aceleradas com o calor).

A Experiência de Fox

Em 1957, o pesquisador norte - americano Sidney Fox aqueceu uma mistura seca de aminoácidos; quando a massa esfriou, verificou que muitos deles se combinaram, formando ligações peptídicas, através de síntese por desidratação, e moléculas resultantes eram muito semelhantes a proteínas, o que Fox denominou proteinóides termais.

Quase todas as ligações peptídicas formadas são do tipo usual, porém alguns proteinóides apresentam uniões equivocadas entre partes das cadeias laterais. Na verdade, não se podia esperar que polímeros pré-bióticos apresentassem o grau de perfeição de uma proteína sintetizada por um sistema vivo.

Fox supôs que os aminoácidos formados no oceano primitivo poderiam ter sido arrastados e abandonados pela água sobre terrenos vulcânicos, onde podem ter secado por evaporação e polimerizados pelo calor. Os proteinóides resultantes poderiam ter sido novamente levados para o mar, encontrando-se preparados para qualquer outro processo pré-biótico subseqüente. No momento em que esses aglomerados puderam crescer e se reproduzir, teria se dado o salto definitivo para o surgimento da vida.

Essa experiência dá uma possível resposta ao problema: como poderiam as proteínas terem se formado antes que houvesse seres vivos para produzi-las?

O que veio primeiro, o gene ou a proteína?

A hipótese gênica, segundo a qual os ácidos nucléicos teriam surgidos antes das proteínas, foi enunciada primeiramente pelo geneticista H. Muller, em 1929. Expressa em termos modernos, essa hipótese postula que uma molécula de ácido nucléico pode possuir a capacidade potencial para vida, devido à sua capacidade de codificar para proteínas e de sofrer auto - replicação e mutação.

A hipótese gênica permaneceu desenvolvida de forma incompleta por alguns anos, mas, com o conhecimento mais recente da genética molecular, ela foi elaborada mais especificamente por uma série de investigadores, especialmente N.W.Pirie, N.Horowitz (1959), F.H.C.Crick, L.E.Orgel, MacCarthy e Holland (1965).

Fatos que apoiam a hipótese gênica

Um fato é a existência de estruturas como os vírus, que, numa explicação mais simples, nada mais são do que um complexo de uma única molécula de ácido nucléico, que contém a informação, com um envoltório de proteínas.

Outro fato interessante é a incrível versatilidade de funções que os nucleotídeos (unidades que formam os ácidos nucléicos) desempenham em organismos modernos: além de fazerem parte da estrutura dos ácidos nucléicos , nucleotídeos específicos ou derivados de nucleotídeos também servem como transportadores de hidrogênio ou elétrons (NAD, NADP, FAD), como transportadores de açúcares (NDP), como transportadores de componentes lipídios (CDP) e como transportadores de grupos acila (CoA). Assim, os nucleotídeos são importantes elementos funcionais em todos os aspectos do metabolismo e da transferência de energia, bem como no mecanismo genético.

Outras evidências

Em 1981, o investigador Cech e seus colaboradores, ao estudar RNA de protozoário, detectaram uma capacidade auto-catalítica. Posteriormente, detectaram uma forma diferente de RNA, que pode catalisar a organização de outros RNAs, durante o processamento de transcritos precursores nucleares, sem o auxílio de enzimas protéicas. A descoberta desses RNAs, com capacidade catalítica, fortaleceu mais ainda a hipótese gênica, pois esta propriedade era considerada como exclusiva das proteínas.

Essa moléculas de RNAs, capazes de catalisar reações como se fossem enzimas, foram denominadas riboenzimas. Essas moléculas, inicialmente, teriam funcionado, ao mesmo tempo, como modelos com capacidade de se auto-replicar e como agentes catalisadores que promoviam as reações de replicação.

Os químicos Leslie Orgel, do instituto Salk americano, e Jeck Szostak, do hospital geral de Massachusetts, são alguns dos cientistas que têm obtido mais sucesso na elaboração, em laboratório, de sistemas capazes de reproduzir algumas das reações do processo de replicação do RNA, como, por exemplo, a montagem de seqüências de nucleotídeos para formar oligonucleotídeos.

Pela explicação da hipótese gênica, os primeiros organismos vivos teriam, portanto, genomas de RNA. No entanto, o aparecimento paralelo das duas classes de macromoléculas (proteínas e ácidos nucléicos) não pode ser totalmente descartado.

Hipótese autotrófica e heterotrófica

Alguns estudiosos sugeriram que os primeiros seres vivos já eram auto-suficientes, capazes de fabricar seu alimento. Um organismo capaz de produzir o alimento de que necessita é chamado de autotrófico; todas as plantas clorofiladas e certas bactérias são autotróficas.

Essa hipótese, conhecida como hipótese autotrófica, tem contra si o seguinte argumento: todas as reações químicas relacionadas com a síntese de alimento são muito complexa, exigindo do organismo uma estrutura também complexas. Se os organismos primitivos foram capazes de sintetizar alimentos, precisamos admitir que tenha aparecido repentinamente um sistema complexo de síntese.

A hipótese mais aceita atualmente é a hipótese heterotrófica, que supõe que a forma mais primitiva de vida obtinha alimento disponível no ambiente externo a ela, sendo, portanto, heterotróficos (incapaz de fabricar seu próprio alimento).

Diferença entre hipótese heterotrófica e geração espontânea

Há uma diferença muito importante, pois a noção original de geração espontânea implica no fato de que organismos complexos pudessem surgir repentinamente de matéria bruta e, também, que esse processo contínuo pudesse ocorrer todos os dias. A hipótese heterotrófica supõe que um organismo muito simples tenha evoluído vagarosamente a partir de moléculas orgânicas já existente antes do aparecimento da vida há bilhões de anos atrás, sob condições muito especiais.

Surgimento da fermentação e da fotossíntese

Os seres heterotróficos eram, provavelmente, organismos muito simples, que, através de reações químicas elementares, conseguiam obter energia para a sua sobrevivência degradando a matéria orgânica em substância mais simples, sem a presença de oxigênio. Os primeiros heterotróficos eram, portanto, anaeróbicos, o que faz supor que o mecanismo utilizado era a fermentação, que é o mecanismo mais simples de obtenção de energia.

Com a fermentação, a quantidade de CO2 liberada começou a aumentar. À medida que o tempo passava, reduzia-se o alimento, e os sistemas químicos continuavam a evoluir. A vida não se extinguiu porque alguns organismos devem ter desenvolvido a capacidade de fabricar, a partir de substâncias simples, como água e gás carbônico, as moléculas complexas que lhes serviam de alimento, surgindo, assim, os seres autotróficos fotossintetizantes. Esses seres liberavam oxigênio, gás que não havia na atmosfera terrestre. Somente a partir daí e do aumento da complexidade dos sistemas químicos é que surgiram os primeiros organismos heterotróficos aeróbicos (respiração aeróbica). Esses organismos não são capazes de produzir seu próprio alimento e utilizam substância orgânica e oxigênio para liberação de energia.

Tanto fermentação como a fotossíntese e a respiração aeróbica são processos que permaneceram ao longo do tempo, ocorrendo mesmo nas condições atuais da Terra.

Sugestão para sala de aula:

Experiência para ilustrar o experimento de Pasteur :

Materiais:

. 6 frascos de vidro de 100 ml (que possa receber calor)

. algodao

. papel de alumínio

. panela de pressao

. 1 tablete de caldo de carne

. água

. fonte de chama

. 1 rolha de borracha (para fechar os frascos)

. barbante

. parafina

. 1 tubo de vidro reto, de 8 a 10 cm

. 1 tubo de vidro em S, de 18 a 20 cm

Como proceder:

. Esterilize os frascos, as rolhas e os tubos de vidros, fervendo-os por 15 minutos.

. Dilua o tablete de caldo de carne em 500 ml de água, deixe ferver por 15 minutos.

. Distribua o caldo fervido em quantidades iguais nos 6 frascos de vidro:

Frasco 1: deixar aberto.

Frasco 2: fechar com a rolha de borracha e vedar com parafina. Aqueça por 10 minutos, em banho-maria (cuidado para não tocar na rolha com a mão, no lado que ficará dentro do frasco).

Frasco 3: amarrar com barbante o papel de alumínio para proteger os algodões (os algodões não devem molhar). Fechar com algodão, introduzir o tubo em S e vedar bem com papel de alumínio. Ferver em panela de pressão durante 10 minutos.

Frasco 4: Fechar com algodão ( protegê-lo com o papel de alumínio), introduzir o tubo reto e vedar bem com papel de alumínio. Ferver em panela de pressão durante 10 minutos.

Frasco 5: Fechar com algodão (sem o papel alumínio), e ferver em banho-maria por 10 minutos.

Frasco 6: Fechar com algodão, vedar com o papel alumínio, amarrar firmemente com barbante. Ferver durante 10 minutos em panela de pressão.

OBS: depois de ferver os frascos na panela de pressão ou em banho-maria, deixe-os em local em que não incida luz direta.

Prepare uma tabela indicando a data de observação e a aparência do caldo. No início, observe uma vez por dia e, depois, semanalmente, após a primeira semana. Para observações mais detalhadas dos resultados, pode-se preparar uma lâmina com o material e observar ao microscópio.

Este experimento pode ser utilizado com várias finalidades, mostrar se os organismos surgem da matéria bruta ou a partir de outros microorganismos preexistentes; trabalhar com os alunos as etapas do método científico, propondo problemas para serem investigados, ou seja, permitir que o aluno participe ativamente da investigação científica e, principalmente, mostrar a relação desse experimento com o dia-a-dia:

Algumas questões para serem discutidas:


 

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